Naquela casa castanha,
Dizem que lá morava,
Uma ninfa que cantava
Com uma voz linda e estranha!
Quem por lá passava então,
Parava junto à janela,
Ouvindo a voz mais bela,
De ternura e emoção!
Sempre de porta fechada,
A ninfa se escondia,
E não cantava de dia,
Cantava de madrugada!
Quanta gente adormeceu,
Nas madrugadas sem luz,
Com esse dom que Jesus,
Á bela ninfa ofereceu!
Ecoava a melodia,
Pelas montanhas e serras,
E gente de outras terras,
O grande jardim enchia.
Dormitavam no relvado,
Como que enfeitiçados,
Beijavam-se os namorados
Após se terem zangado!
Era um mundo de magia,
Réis e monges ansiosos,
Perguntavam curiosos:
Porque não canta de dia?!
Um avô de barba branca,
Disse triste, angustiado:
Olhai ali no relvado,
Aquele sapinho que manca!
Oh! Como manca o coitado!
Exclamou o rei Cadilho,
Que se lembrou do seu filho,
Que foi amaldiçoado!…
Penosa história lembrou…
Chorou junto do sapinho,
Lembrou-se do adivinho;
Das coisas que lhe contou…
“Teu filho Artur foi levado,
Por uma bruxa peluda,
Por inveja a cabeluda,
Transformou o teu amado!…
Também levou a princesa,
Fez dela uma serpente,
Que por ser tão repelente,
Não quer que ninguém a veja!
O adivinho não podia,
Dizer mais ao pobre rei,
Nem à rainha e ao frei,
Pois era negra magia…
Não fosse a bruxa encontra-lo!
Nunca falou do sapinho,
Andava solto e sozinho,
Podia a bruxa matá-lo!
Um dia de névoa quente,
Quando a bruxão maltratava,
O belo Artur a mancou,
Fugiu dela de repente…
Onde vais, lindo rapaz?
Sapo, sapo és agora.
Ah! Pensas que vais embora?
Manca sapo, eu vou atrás!
Escondido e com medo,
Que a bruxa o encontrasse
Esperou que a noite passasse,
Encolhido num penedo.
Depois do susto passar,
Viu sua triste figura!…
Sou um sapo! Que amargura!
Sou um sapinho a mancar!
Ao chegar a madrugada,
Chorou tanto a sua dor,
Que a ninfa cheia de dor,
Sentia a sua chegada!…
Presa na casa amarela,
Deixou sua voz voar,
Para seu amor achar,
A casa lá na montanha!
Estremeceu o sapinho,
Com a voz da sua amada,
Seguiu-a de madrugada,
Mas, é tão longe o caminho…
Cala-se a ninfa de dia,
Só canta de madrugada,
Sabe que a bruxa malvada,
Pode aumentar-lhe a agonia!
O triste sapinho coxo,
Sente um vento estridente,
É a bruxa! Logo o sente,
Vem transformada, num mocho!
Ai! Que grande! Que feroz!
Vai-me apanhar de certeza!
Oh! Minha bela princesa,
Ai, o que vai ser nós?!
Anda cá sapo, sapão,
Vais morar na minha casa…
Monta aqui na minha asa,
Ou vais para o caldeirão.
Senhora bruxa, alteza!
Transforme-se em mulher,
O mocho não faz sequer,
Justiça à sua beleza!
A bruxa toda vaidosa,
À sua frente rodou…
Rodou tanto que ourou,
Caiu da pedra rochosa.
Ufa! Que sorte, escapei.
Da bruxa feia e peluda,
Às vezes a sorte muda,
Infelizmente isso sei.
Adeus oh bruxa malvada,
Tenho pressa de ir embora,
Que está quase na hora
De nascer a madrugada!
E o sol lindo, vibrante,
Traz mais magia no ar,
A voz da ninfa a cantar,
E o sapinho viajante!
Pensativo vai na estrada,
Aos saltos como os sapinhos;
Como dará seus carinhos,
À sua formosa amada?
Sou um sapo. Estremece!
Não sabe ele que seu amor,
Vive assim na mesma dor,
Por isso nunca aparece!
O que irá acontecer?
O sapo está a chegar,
A sua amada a cantar,
Ansiosa por o ver!…
Não aparece ele assim…
O sapo então coitadinho,
Amanha-se num cantinho,
No relvado do jardim.
Também está amedrontado…
Imagina os caracóis
Dourados como mil sóis,
Do príncipe do passado!
E a ninfa a rastejar,
Canta lembrando a princesa,
Dos olhos cor de turquesa,
E do amor do seu lar!
Então uma bela fada,
Passou ali por acaso
Despertou-lhe o estranho caso,
Da princesa enfeitiçada.
Perguntou ao avozinho:
Posso ir ver a serpente?
E o povo de olhar descrente,
Abriu alas no caminho.
Quem é ela? Donde vem?
De que serpente ela fala?
A serpente não exala,
A voz que uma ninfa tem.
Não é ninfa! É a princesa!
E o avô de barba branca,
Trouxe o sapinho que manca,
O filho da realeza!
Juntou-se o povo pasmado,
Perante a casa castanha,
Onde a voz linda e estranha,
O mundo tem encantado!
O avô é guardião,
Da princesa enfeitiçada,
Esperando pela fada,
Da varinha de condão!
Tanto alarme e frenesim,
Que depressa o rei Cadilho,
Sentiu logo que era o filho,
O sapinho do jardim.
Rainhas, reis, baronesas,
Foram até à montanha,
Abriu-se a porta castanha,
Que ecoou nas redondezas.
Comovido o guardião,
Levou o sapo à serpente,
A fada muito contente,
Pegou no lindo condão.
Artur! Sapinho, sapão!
Vou teus olhinhos fechar,
Abre-os quando eu contar,
Três pancadinhas no chão!
Serpente! Dulce amorosa!
Vou teus olhinhos fechar,
Abre-os quando poisar,
Nas tuas mãos uma rosa.
Truz! Truz! Truz, acaba a dor,
O feitiço da malvada,
E nas mãos da tua amada,
Poisa a rosa do amor.
Foi-se a fada abençoada,
Feliz com a bela ação,
Foi embora o guardião,
A missão estava acabada.
Houve festa com bailado,
Reis e rainhas bailaram,
Dulce e Artur, se beijaram,
Num abraço, apaixonado!
Felizes, cheios de paz,
Partiram para o castelo,
E desse amor forte e belo,
Nasceu um lindo rapaz.
Chamaram-no de João,
O nome do avozinho,
Desse tão doce velhinho,
O mais fiel guardião.